Tenho saudades de casa. Tenho saudades da família, do gato e do cão. Das minhas quatro paredes, da minha vista da varanda, das minhas tardes de sofá. Dos tempos vivos e dos tempos mortos. Da mesa posta na cozinha, do cheiro da comida acabada de fazer, do sabor caseiro e familiar.
Tenho saudades de ouvir a música de todos os dias, a que demorava exactamente o tempo de chegar a trabalho. Curiosamente, “America”, dos Razorlight. Dos esforços do ginásio e dos rodopios dançantes nas aulas de ritmos quentes ao final da tarde.
Tenho saudades da medicina e de ser médica. Tenho saudades de exercer, de ser útil, de ajudar, de servir. Tenho saudades de sentir que fiz uma consulta bem feita, que fui ao encontro do doente e das suas necessidades, que correspondi ou que ultrapassei as suas expectativas. Tenho saudades das famílias, das crianças que acompanhei e dos bebés que vi crescer, vindos das barrigas das suas mães que vinham ter comigo para seguimento da sua gravidez. Tenho saudades do trabalho em equipa, e até de certo modo da correria de um serviço atarefado e de uma urgência cheia.
Tenho saudades das conversas profundas. Tenho saudades de conhecidos e amigos, de conversas individuais ou em grupo, de risos e gargalhadas familiares, de espaços comuns. Tenho saudades dos abraços daqueles que me querem bem e de braços que me queiram de forma recíproca.
Tenho o mundo nas mãos e saudades de coisas banais. Tenho internet e redes sociais. Tenho a visão que os do lado de lá me fazem chegar, embora não tenha o tacto ou o olfacto. Mas encontrei o sabor a casa numa chávena de café.