O Parque Nacional Torres del Paine – do Refúgio Paine Grande ao miradouro britânico

Rumamos ao Parque Nacional Torres del Paine pelas 5:30h da manhã, após um pequeno almoço regado de adrenalina com cheiro a café. Tínhamos passado a véspera a organizar tudo da melhor forma que sabíamos: fomos ao supermercado, alugámos material de campismo, escolhemos as roupas mais práticas e quentes e transportar, preparámos refeições rápidas, montámos a mochila… Sabíamos os percursos, as distâncias, tínhamos visto o mapa diversas vezes… estávamos mentalmente preparados para fazer mais de 60Kms de caminhada em 3 a 4 dias… mas não tínhamos nenhuma reserva.

Até há 3 dias atrás isso não teria sido um problema. Em pleno Parque Nacional das Torres del Paine existem 3 formas de pernoitar: em hotéis, em refúgios ao longo dos trilhos ou nos acampamentos que os acompanham. Como todos tínhamos tenda, saco cama e afins, estávamos seguros de que conseguiríamos um lugar. Ainda para mais, “Pancho” (o dono do hostel onde estávamos alojados) tinha sido guarda florestal no parque, e conhecia todos os seus detalhes e segredos. Caso não houvesse lugar, só teríamos de regressar ao acampamento depois de ter partido o último barco – e aí, não haveria alternativa senão deixarem-nos ficar.

Contudo, estamos no final da temporada e exactamente a poucas semanas (dias?) da mudança da estação. As noites começam a ser mais frias, os ventos cada vez mais fortes e as chuvas mais frequentes… a lotação está completa, e mesmo com alguns extras acima das capacidades. Não nos deixaram ficar no primeiro objectivo – o camping Paine Grande – o qual seria a nossa base para o percurso do primeiro dia: o trilho até ao Glaciar Martial.

Sem tempo útil para fazer este percurso, optámos por deixar toda a bagagem de lado e caminhámos apressadamente em direcção aos miradouros francês e britânico, o “highlight” da porção central daquilo que é o “Circuito W” – nome devido à forma que o trilho adquire quando completado na zona sul do parque. 14Kms até ao miradouro britânico e voltar antes da saída do último barco, num total de 28Kms em cerca de 8 horas.

Rapidamente nos desfizemos em dois grupos, um que tencionava chegar até ao final e outro que preferia aproveitar o caminho com mais tranquilidade. Eu fiquei no segundo grupo, por não me identificar com o objectivo dos restantes elementos. Não que não quisesse chegar ao fim mas esta viagem é sobre a jornada e não sobre o destino. Preferi abdicar da porção final deste percurso em benefício de o percorrer a ritmo próprio, disfrutando de todas as paisagens e parando para fotografar sempre que me apetecesse, sem pressas ou obrigações. Ainda assim, a minha distância foi de 20,5Km nesse dia.

A vista manteve-se sempre ao nível daqui que era possível observar a partir do lindíssimo Lago Pehoé: rochedos dramáticos que rasgam o céu, com rajadas de vento vindas do nada mas que se fazem anunciar como o som de um comboio ao atravessar ao descer as escarpas. Avalanches decorridas dos raios de sol que quebravam os blocos de gelo transformando-os em gigantes nuvens de algodão (muito doce). Hectares verdes e de monólitos graníticos, interrompidos por outros hectares de árvores queimadas pela insconsciência humana há anos atrás – em que cerca de 40% do recinto ficou reduzida a cinzas – que adquiriram tonalidades prateadas. E paisagens tão surreais, tão intensas e tão diferentes de tudo por serem nascidas “do nada” que, indubitavelmente, não há palavras que o expliquem. 

Apanhamos o barco pelas 18:30h tal como previsto, tendo encontrado por “sorte” um acampamento exactamente à saída do parque embora na sua ponta oposta – o aceitar de que não nos seria possível fazer o W mas que ao menos teríamos onde dormir sem ter de regressar a Puerto Natales.

a vista do Lago Pehoé sobre as montanhas